quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Sair do quartel d´Abrantes

Sair do quartel d´Abrantes (Artigo)

Washington Novaes é jornalista

A menos de três meses das eleições municipais, pouco se ouve falar sobre o que pensam candidatos e eleitores nos 246 municípios goianos - e é neles que se situam os problemas mais concretos dos cidadãos, não na República ou nos Estados. E são problemas graves e urgentes.

Pode-se começar pelas questões da água, até mesmo por Goiânia. Segundo a Agência Nacional de Águas, o Rio Meia Ponte que passa por 37 municípios até desembocar no Paranaíba, "é um dos sete mais poluídos no país", inclusive na capital, onde chega depois de receber o despejo de esgotos não tratados de várias cidades, aos quais se acrescentam efluentes industriais e a matéria orgânica não tratada nos esgotos goianienses coletados. Mas ainda assim, são suas águas que abastecem 2 milhões de pessoas. Que se vai fazer em Aparecida, com a maior parte de sua população sem rede de esgotos e boa porcentagem dos habitantes ainda sem rede de abastecimento de água? Pode-se também perguntar como será no Nordeste goiano, onde o desmatamento nas terras altas da vizinha Bahia - para plantar soja - reduziu drasticamente o volume de água que corre para essa região de Goiás, abastecida por carros-pipas em todas as estações secas. Como se vai avançar ? Que se vai fazer ?

Na verdade, o panorama do interior goiano ainda é muito difícil, pois os domicílios ligados a redes de esgotos ou com fossas sépticas não devem ultrapassar 40% do total e o déficit no abastecimento doméstico de água ainda deve estar perto de 20% (O POPULAR, 9/5/10). Não é uma situação excepcional no Brasil, onde 528 municípios (23%) racionam água (O Estado de S. Paulo, 20/10/11). Mas candidatos precisam estar atentos: a Caixa Econômica Federal já anunciou que a partir deste ano não financia mais casas em áreas sem serviços básicos. E o Ministério da das Cidades informa (25/10/11) que tem mais de R$ 50 bilhões disponíveis, que não consegue aplicar em redes de coleta de esgotos, por falta de projetos municipais (só 4% dos municípios cumprem a Lei do Saneamento, de 2007). Em Goiás, a área de saneamento informa que precisará de R$ 3 bilhões em 15 anos, para redes de coleta e estações de tratamento.

O capítulo da água não pode terminar sem que se pergunte que programas impedirão que, a cada estação chuvosa, as cidades sejam inundadas nos eventos extremos, cada vez mais frequentes nestes tempos de Mudanças climáticas. Que farão candidatos para impedir que o desmatamento e ocupação de encostas na zona rural continuem a assorear rios, a estreitá-los, a reduzir seus leitos e gerar inundações nas áreas urbanas?

Pode-se passar ao capítulo do lixo. Todos os municípios só têm até este início de agosto para cumprir a Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos e apresentar ao governo federal seus planos municipais de gestão integrada do lixo - e sem eles não poderão receber recursos da União. Quantos terão apresentado em Goiás? Segundo a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, 96% dos 246 municípios goianos continuam a depor resíduos em lixões. Mas, ao que se saiba, nenhum consórcio intermunicipal foi formado para implantar aterros e economizar recursos.

Goiânia mesma só coleta seletivamente 7% de seu lixo domiciliar - e as cooperativas de processadores dizem que não têm capacidade para essa tonelagem, além de praticamente só separarem os resíduos e venderem, sem transformá-los. O restante vai para aterros, o que é um desperdício, pois na média brasileira 80% do que vai para aterros é reaproveitável ou reciclável. Sem esses caminhos, os aterros esgotam-se rapidamente (o de Goiânia, que recebe 34 mil toneladas/mês, só tem mais ano e meio de área utilizável; cuida de outra na vizinhança).

E que dizem os candidatos sobre sua visão do ambiente urbano? Da eliminação das árvores, contribuindo para forte aumento da temperatura nas cidades (costuma passar de 5 graus Celsius, comparada com a das áreas arborizadas ou de vegetação nativa)? Que dizem da expansão desordenada, apesar da existência de imensas áreas dotadas de infraestrutura e não ocupadas (como em Goiânia)? Que têm a dizer diante da estatística de que Goiás só tem 13% de suas escolas funcionando em tempo integral, quando se sabe há décadas que é esse o melhor caminho para a educação de base, para a saúde dos alunos e para contribuir (indiretamente) para a renda das famílias, com uma das refeições no recinto escolar?

Mais ainda, que pensam os candidatos fazer para dotar seus municípios de núcleos especializados em certas culturas e certas áreas de transformação, como já existem alguns, com a participação do Sebrae e de outras entidades? É caminho certo para a geração de trabalho e renda, sem concessões excessivas na área de incentivos fiscais.

São apenas alguns dos ângulos que os eleitores precisam examinar, para decidir seu voto. Não adianta apenas esbravejar inocuamente e permitir que tudo continue como dantes no quartel d´Abrantes.

Fonte: O Popular - GO

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